O excesso parece dominar em vários setores da vida cotidiana. Excesso de excitação, excesso de consumo, excesso de informação, excesso de trabalho, e por aí vai.

É permitido, mas é indecente? Qual o limite? Conhecemos? O que é de fato necessário? Vivemos num tempo onde extremos atraem mais, e queremos sempre ultrapassar, intensidade nas experiências singulares, sobram desejos, falta a arte de comedir. Raros os que se contem, tornou-se exceção os moderados, embora, todos os radicais se julguem moderados e bem regulados a seus próprios olhos.

Cegueira e confusão parecem nos conduzir a maior parte do tempo. Uma teimosia e arrogância natural nos conduzem ao “mais” como conclusão de que isso seria bom. E aí ficamos entre o descartável e o acúmulo, com este último avançando.

Como diz Edgar Morin: “O homem manifesta uma afetividade extrema, convulsiva, com paixões, cóleras, gritos, mudanças brutais de humor; ele carrega consigo uma fonte permanente de delírio.” E assim, não é difícil perceber que não gostamos de limites, ainda que destemperos sejam visíveis.

Chamou-me atenção a música de Arnaldo Antunes em seu recente trabalho intitulado “Disco”:

tem muito carro e muito pouco chão

tem muita gente e muito pouco pão

tem muito papo e muito pouca ação

muito parente e muito pouco irmão

 

e então?

o que vamos fazer então

com mais um milhão?

e depois?

o que vamos fazer depois

com um grão de arroz?

 

tem muito pouca dúvida e muita razão

tem muito pouca ideia e muita opinião

muita pornografia e muito pouco tesão

muita cerimônia e muito pouca educação

 

e então?

e depois?

Temos feito o mundo cada vez mais frágil. A desconfiança cresce, mas plantamos violência, egoísmo, desigualdades. Engolimos caroços de corrupção e injustiças se proliferam, contudo, nos engasgamos é com a fraternidade que virou espinho na garganta, queremos cuspir.

Distanciamentos se ampliam, e a intimidade tornou-se quase desconhecida. Gente articulada, bem armada, bons discursos, mas a prática, o exemplo, o envolvimento minguam.

Fim de ano é tempo de avaliação, de colocarmos coisas na balança existencial, de fazermos faxina na alma, nos guarda-roupas, nas garagens, nos cantos que costumamos acumular. Rever e revisitar, repartir e celebrar. Arrepender e renovar-se. Ainda há tempo de novas escolhas, inéditas posturas.

Senhor Jesus, tem misericórdia de nós, e converte-nos ao teu evangelho – são boas e urgentes novas para o nosso século XXI.