sextasEnquanto Priscila conversava com *Carlinhos, ele olhou bem nos olhos dela e, de repente, contorceu os lábios, repuxou as sobrancelhas e fez uma cara de “bobo”; todos que estavam presentes gargalharam. A funcionária da Casa de Assistência Filadélfia (CAF)**não se irritou com a brincadeira do garoto; ela sabia que aquela alegria tinha mais a ver com a graça de Deus do que com zombaria.

Comunicativo: Carlinhos se expressa bem até pela arte

Comunicativo: Carlinhos se expressa bem até pela arte

Carlinhos é um menino de onze anos de idade e tem uma história sofrida. Até os nove anos, o HIV foi seu companheiro desconhecido. Seus pais já haviam morrido por causa da aids, mas os tios de Carlinhos, com quem ele morava, só descobriram que ele havia nascido com o vírus quando ele foi internado em 2004 no Hospital Emílio Ribas, em São Paulo, SP. Durante três meses em que esteve na cama do hospital, as doenças oportunistas causadas pelo HIV foram enfraquecendo o corpo dele.

A Vara da Infância pediu que a CAF cuidasse de Carlinhos até que ele pudesse voltar à família. Quando a coordenadora da CAF e uma voluntária visitaram Carlinhos, viram um garoto fraco, com dificuldades para caminhar e impossibilitado de usar sapatos, devido às muitas verrugas nos pés. Seu olhar, porém, não perdera a esperança.

Dois anos depois, Carlinhos tem um ar determinado e questionador. A esperança que o acompanhava em 2004 ganhou vida. Sua recuperação física impressiona. Ele vai continuar por mais um tempo na CAF, sendo cuidado e protegido, até ter condições de voltar a morar com os tios, com quem já passa todas as férias e dias de folga.

Carlinhos tem suas responsabilidades diárias (arrumar a cama, estudar, tomar os medicamentos na hora certa), mas também tem seus direitos (brincar com os amigos, assistir TV, descansar, fazer bagunça de vez em quando, relacionar-se com Deus). Um equilíbrio que ele não vivenciou anos atrás quando sofria preconceito por causa da aids.

Uma das coisas que Carlinhos mais aprecia é pintar quadros. “Ele tem facilidade de se expressar, talvez por isso tenha o dom voltado para as artes. Faz amizades facilmente, porém deixa bem claro o que gosta e o que não gosta, sempre procurando um jeito especial em dizê-lo”, conta Priscila.

A fé que Carlinhos tem em Deus é vibrante. “Para mim, Deus é bondoso. Ele ajuda as pessoas e também foi ele que salvou minha vida. Se eu for contar tudo o que Deus fez por mim, não vou acabar nunca”. Com sonhos simples, ele refaz a própria história: “Quero ser policial, fazer o bem, ajudar os outros…”

O amor de Deus e o cuidado dos funcionários da CAF e dos médicos transformaram a vida e a alma de Carlinhos. “Quando crescer, eu pretendo ajudar outras crianças a não passar pelo que eu passei”. Eis uma prova de que, na verdade, a aids não pode destruir a dignidade humana.

Notas

*Nome fictício.
**A Casa de Assistência Filadélfia existe desde 1988. Abriga crianças soropositivas, trabalha na educação e prevenção contra abuso sexual e na geração de renda para famílias. Atualmente, atendia cerca de 350 pessoas no Estado de São Paulo. Informações: <www.caf.org.br> ou (11) 2041-6140 / 2280-0367.

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Artigo publicado originalmente na Revista Mãos, edição 16.

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