Por Maurício Avoletta Júnior

Todo jovem tem a terrível tendência de multiplicar o sofrimento que passa e elevá-lo à décima potência. Isso é comum, todos já passaram por isso. Às vezes esse sofrimento está relacionado a um coração partido, outras vezes a uma expectativa não suprida, mas sempre permanece a mesma mania de piorar a situação quando, na verdade, ela nem é tão ruim assim.

Quando esses momentos de sofrimento – e às vezes de solitude – terminam, percebemos que não apenas estamos mais fortes e mais maduros, como também que aquilo que antes achávamos ser o maior de todos os sofrimentos estava apenas sendo observado pelas lentes do exagero ou, talvez, da imaturidade. Na medida em que crescemos, sofrimentos maiores nos alcançarão. Como C.S. Lewis já disse, o sofrimento é o megafone de Deus para despertar um mundo morto.

Acho curioso esse modus operandi de Deus: quanto mais amor nos é revelado, mais o sofrimento nos alcança. Ao participarmos dos sacramentos do batismo e da eucaristia, por exemplo, tomamos parte da vida de Cristo até que Ele seja tudo em todos. Porém, há um aspecto pouco contemplado por nós, cristãos, na compreensão de tomarmos parte da vida de Cristo. Ao participarmos dos sacramentos, tomamos parte também dos sofrimentos de Cristo.

Quando o Apóstolo Paulo profere aquela famosa frase, já não sou mais eu quem vivo, mas é Cristo quem vive em mim, em Gálatas 2:20, ele não está dizendo que a vida cristã consiste em viver tendo Cristo como exemplo de bom moço. O que São Paulo está falando é que num dado momento de sua vida, ele morreu e ressuscitou em Cristo e, portanto, é Cristo quem vive através dele. Se nos tornamos Cristo, devemos então esperar sofrermos os sofrimentos dEle.

Em seu clássico Cristianismo Puro e Simples, Lewis chama nossa atenção para a primeira aparição do termo cristão. Foi em Antioquia que os discípulos foram chamados assim pela primeira vez (Atos 11, 26). A palavra grega para cristãos é CHRISTIANOUS, ou seja, aqueles que são como o Cristo, ou, os pequenos cristos. Ser cristão é ser um talmidin de Cristo, um discípulo. Os talmidins, no judaísmo, eram aqueles que seguiam seus rabi’s tão de perto que ficavam cobertos pela poeira que levantava pelo caminho que seus mestres passavam. O Cristão, por essência e por necessidade, é um pequeno Cristo, um verdadeiro cristinho. É aquele que, literalmente, busca abandonar sua vida para viver a vida de outrem.

A mensagem evangélica é e sempre será uma mensagem subversiva. O Cristianismo nos diz, principalmente hoje em dia, o exato oposto do que o mundo tem falado. Tornou-se consenso a ideia errônea de que nossa identidade está em nossa sexualidade, em nossos bens ou em nossos trabalhos, e que buscar essas coisas é sinônimo de ter menos sofrimento. O Cristianismo, contrariando as máximas seculares, afirma que nossa identidade está em Cristo e, quanto mais perto dEle, mais sofrimento teremos.

Em Cristo, nossa identidade é relativizada segundo a identidade dEle. Fomos adotados por Deus, somos seus filhos e não há filho que o Pai não castigue, a fim de aperfeiçoá-lo (Hebreu 12:5,6).

Há uma máxima, novamente no Cristianismo Puro e Simples do Lewis, que, basicamente, diz que a principal vontade de Deus é nos destruir. Sim, Ele deseja destruir o que nos tornamos, a fim de voltarmos a ser o que éramos no início de tudo. Ainda que exista algum bem escondido no ser humano, nossa existência e, principalmente, nossa identidade foi maculada pelo pecado. Há uma mancha em nossa identidade que não nos permite conhecer a nós mesmo. Apenas vivendo a vida de Cristo e sofrendo suas dores é que nos tornaremos quem devemos ser.

Amar o próximo como a si mesmo, para uma criatura egoísta e autocentrada, figura entre as maiores dificuldades da existência. Amar o próximo mais do que a si mesmo, é, em outras palavras, deixar de dar atenção para nossas imaturidades e vontades mesquinhas para brilharmos a luz de Cristo para pessoas que vivem na escuridão.

Todo jovem tem a terrível tendência de multiplicar o sofrimento que passa e elevá-lo à décima potência. Isso é comum, todos já passaram por isso. Todavia, devemos crescer com as dificuldades e nos preparar para dificuldades maiores. É assim que nosso Pai nos aperfeiçoa à imagem de Cristo e é assim que honramos o nome de cristãos, sendo cristinhos para o mundo.

  • Maurício Avoletta Junior, 24 anos. Congrega na Igreja Batista Fonte de Sicar (SP). Formado em Teologia pela Mackenzie, estudante de filosofia e literatura (por conta própria); apaixonado por livros, cinema e música; escravo de Cristo, um pessimista em potencial e um futuro “seja o que Deus quiser”.

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