Por Vinicius Vargas

Sempre gostei de ouvir a Banda Resgate. Suas canções têm sido a trilha sonora da minha vida. Uma delas chama-se ‘Depois de Tudo’. O refrão define bem a história que vou contar.

Lá pelos idos de 2006, fui convidado para lançar um projeto missionário no Sertão do Tocantins. Recém-casado, esposa de acordo com nossa ida. Recém-formado em Teologia, quase pastor.

O projeto era grande, caro e complexo. Não dava pra ser feito do dia pra noite. Até que todas as condições estivessem em dia, fomos convidados a ajudar uma congregação da mesma igreja perto da nossa casa.

Nossa igreja local era na mesma quadra em que morávamos, nem atravessámos a rua. Na congregação, tínhamos que ir de carro. Uns 15 minutos, incluindo um trecho da rodovia federal.

Lá na Congregação tinha um pastor, um irmão que tinha sido missionário na Bolívia, além do pastor da igreja e líderes experientes. Todos eles tinham idade pra ser meu pai. Eu tinha só 24 anos nessa época.

Chegamos em outubro. Em dezembro, o pastor da Congregação se desligou do projeto. Razões pessoais. Ele era militar e a região era cercada de favelas. Temeu pela segurança. Não tiro sua razão.

Fato é que em janeiro o pastor da Igreja e o missionário iriam sair de férias. Por falta de opção, durante aquele mês eu iria ser o responsável pela Congregação. Assim foi. Uma senhora que fazia parte dos cultos de mulheres, que eram realizados às quartas à tarde, levou a neta pra ser apresentada a Deus. Fiz a apresentação, oramos, preguei, e os pais da menina (filho e nora da senhora) se converteram.

Outros mais foram chegando. Quando terminou janeiro, a Congregação estava com os cultos melhor organizados, com mais gente frequentando e com novos crentes que tinham chegado. O pastor não pensou duas vezes: me deixou responsável em definitivo por aquela Congregação. Eu não ia mais ser missionário em Tocantins. Minha Missão ia ser no Rio mesmo.

Eu estava fora de casa, trabalhando, de lá ia pra faculdade. As conversas com ele foram por telefone e Whatsapp, contei a notícia a alguns amigos e parentes que tinham estado lá conosco no começo. Todos ficaram tristes e perplexos, entre as tentativas de tentar entender o que houve e de fazer alguma coisa sobre a situação. Cabia a mim perguntar o que eu podia fazer pra ajudar. A resposta era simples, e quase óbvia, mas eu não estava preparado pra isso: “a única coisa que você pode fazer pra ajudar, é voltar pra cá”.

Em julho de 2007, fui ordenado ao ministério. Tinha 25 anos. Dois anos depois, em agosto de 2009, a Congregação foi organizada como igreja autônoma. Fui pastor da Igreja até março de 2012. Conjunturas internas e externas me fizeram optar por sair. A igreja escolheu outro pastor, anos depois teve um terceiro.

Não me envolvi mais com as coisas daquela igreja, embora todas as pessoas que discipulei e batizei, os casais que celebrei os casamentos e tantas outras histórias juntos, me mantinham ligados a eles de alguma forma.

Segui a vida, voltei para minha igreja de origem, voltei a estudar, fiz pós e Mestrado em Teologia, iniciei um Doutorado, e estava feliz pastoreando jovens e estudando quando, numa segunda-feira de novembro passado, recebi uma ligação de um amigo da antiga igreja.

Ele me contou que uma grave dificuldade na igreja fez com que a única alternativa encontrada fosse o encerramento total das atividades de lá. A igreja que eu ajudei a fundar, e pela qual tinha tanto carinho, não existia mais.

Aí começam as conversas (por telefone): minha família, o até então pastor daquela igreja, meu pastor, o pastor que me levou pra lá, todos os membros da igreja (eram 70 quando saí em 2012, em novembro de 2018, eram 8). Todos foram unânimes na resposta de que minha ida seria uma boa solução.

A igreja, pastoreada por Vinicius, em 2019

Decidi encarar o desafio. Na quarta-feira a igreja se reuniu, desfez a decisão de encerrar as atividades, aprovou o pedido de saída do pastor e me elegeu novo pastor presidente. A posse foi logo no outro domingo. Tudo aconteceu em paz, em concordância e rápido. Coisas que só Deus faz.

Já em dezembro, batizamos 4 novos membros. E pra minha alegria, 3 deles são adolescentes. Eu, que sou apaixonado por pastorear as juventudes, fico maravilhado quando essas coisas acontecem!

Agora somos quase 30 membros, muitos voltaram, a igreja está feliz, eu mais ainda. Mês passado batizei outro adolescente. Não interrompi o doutorado, e Deus vai organizando pra que tudo se encaixe perfeitamente. Mês que vem a igreja completa 10 anos de emancipação. Eu estava naquele primeiro dia. E lá estou eu de novo. Feliz como há 10 anos. E pelo tempo que Deus quiser.

Eu sei onde tudo começou, e quem, eu sei, é fiel pra terminar!

O mal, eu sei bem porque passei,

Atravessar o deserto e depois de tudo ainda crer na promessa…

  • Vinícius Vargas é marido da Izabela e pai do Eduardo e da Eliza. Pastor da Missão Batista em Jardim América – RJ, membro do comitê de capacitação de líderes da Juventude Batista Brasileira, mestre e doutorando em Teologia Sistemático-Pastoral pela PUC-RJ.

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