Por Lucas Peterson Magalhães

Nessa época do ano é comum realizarmos balanços das diversas áreas de nossas vidas. Refletir sobre quantas das metas traçadas no início de 2018 foram atingidas, o número de vezes que conseguimos acordar mais cedo para ir treinar, os quilos (ou gramas) perdidos na balança, os amigos que conseguimos visitar e nos (re)aproximar, os cursos, projetos e desafios cumpridos.

Esse texto se propõe a fazer um pouco disso. É um resumo de um dos ramos da minha vida, sob o enfoque em que ele mais foi abordado: Igreja. Qual a sua necessidade?

Dois mil e dezoito foi bem duro para mim e para minha igreja. Quase todos os dias nos deparamos com a seguinte pergunta: “por quê?”.

Dois textos têm me ajudado a responder essa indagação. Um é uma conversa que aconteceu há quase dois milênios, enquanto o outro é uma música lançada há cerca de um mês.

O primeiro está retratado no Evangelho de Lucas. Jesus toma emprestado o barco de Simão (Pedro) para usar como um palquinho para pregar à multidão que o seguia. Tendo acabado de falar, Jesus diz pra Simão ir aonde as águas são mais fundas e jogar as redes para pesca. Simão, meio reticente, avisa a Jesus que ele e seus parceiros pescaram a noite inteira e não pegaram nada, mas porque era Jesus quem estava falando ele ia fazer. Resultado: as redes ficaram tão cheias de peixes que começaram a rasgar-se. Pedro e seus amigos ficaram perplexos. Jesus conclui dizendo a Simão para não temer, pois “de agora em diante ele seria pescador de homens”.

A segunda composição que tem mexido bastante comigo é o novo single do Supercombo. E eu sugiro que você ouça agora, antes ou enquanto lê o restante do texto, dando o play no vídeo logo abaixo.

A música é dividida em duas fases, duas etapas da jornada.

1ª parte

Antes de sermos dois a gente tem que saber ser um,
Degustar um pôr do sol sozinho.
Antes de pôr os pés a gente tem que observar
Se vai dar pé ou só te afogar.
Deixa puxar a rede, filtrar o que interessa, o mar não tá pra pesca.
Se o ódio nos divide e o amor nos completa, vamos juntar as peças.

É um chamado à autorreflexão [obrigado novo acordo ortográfico por essa bela palavra]. Ou seja, a olhar para si. A importância de se entender como indivíduo antes de fazer-se coletivo. É nesse aspecto que a crise desperta dentro da igreja. Em vez de encontrar um “jugo suave e um fardo leve”, os cristãos têm se deparado com a exigência de fazer mil e uma coisas e programações que não lhe dizem mais respeito, que não se comunicam com o seu próprio “eu”. A estrutura da Igreja é pesada. Quanto mais Organização, menos Organismo. Não dá mais pé. E quando vemos já estamos longe o bastante pra voltar à margem, para respirar.

A Igreja perde seu sentido.

2ª parte

Depois de sermos um a gente tem que saber ser dois.
Se botar à prova confiança não pode falhar.

Tem que se jogar. A jangada faz cruzeiro em alto-mar.

Deixa puxar a rede, filtrar o que interessa, o mar não tá pra pesca.
Se o ódio nos divide e o amor nos completa, vamos juntar as peças.

Vamos puxar a rede, sem cabo-de-guerra, vamos quebrar a cabeça.

Vamos puxar a rede, filtrar o que interessa, o mar não tá pra pesca.
Se o ódio nos divide e o amor nos completa, vamos juntar as peças.

Entretanto a música não se limita ao “eu”. A segunda estrofe é um convite a levantar a cabeça e a buscar sentido no outro. É antes de tudo um chamado à Confiança. O Evangelho de Cristo não se restringe ao bloco do eu sozinho, tem que se jogar em direção ao próximo. E aqui se apresenta uma das metáforas mais bonitas: a Igreja que Jesus sonhou é essa jangada que faz cruzeiro em alto-mar.

Eu sei, tão vendendo outra coisa por aí. Mas a Igreja de Jesus não é um Transatlântico luxuoso, imponente, confortável e all-inclusive. É a mesma jangadinha de Simão e seus amigos.

Reparem: do mesmo jeito que na história de Jesus e Simão, o mar continua não estando pra pesca. Mas Cristo insiste em nos dizer “vão para onde as águas são mais fundas”.

A missão? Vamos juntar as peças! Num mundo, num Brasil e numa Igreja divida pelo ódio, a mensagem que completa todo e qualquer indivíduo continua sendo o amor.

Sim, essa música me fez desistir da igreja. Mas dessa igreja Transatlântico, que parece propagar o ódio que nos divide e distribuir um fardo pesado que não é o de Cristo.

Ao mesmo tempo, tal como Simão, me sinto uma pequena jangada. À deriva. Só posso ousar fazer um cruzeiro em alto-mar com os outros, com os meus parceiros. Com a Igreja de Cristo. Que resiste. Que é farol a iluminar a escuridão azulada dos Oceanos. Que é abrigo para todos os náufragos que estão quase se afogando. Que continua sendo a mesma jangadinha de Simão e seus amigos.

Vamos puxar as redes?

  • Lucas Peterson Magalhães, 26 anos. Formado em Direito, participa da Comunidade Evangélica em São Bernardo do Campo (SP).

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