Tem havido uma considerável sucessão de missionários cristãos dedicados e bem instruídos entre os muçulmanos. Só de mencionar os nomes de Henry Martyn, Samuel Zwemer e Temple Gairdner já notaremos os admiráveis homens de Deus que deram sua mente e vida à tarefa de comunicar Cristo aos seguidores de Maomé. Em minha geração, um dos mais conhecidos nomes nesse meio é o bispo Kenneth Cragg, cuja abordagem dialógica aos muçulmanos tem sido a principal inspiração da série de livros intitulada Christian Presence, editada por Canon Max Warren. A declaração completa do bispo Cragg aparece em seu livro The Call of the Minaret. Ele interpreta o convite do muezim não apenas como uma convocação à oração dirigida aos muçulmanos, mas também, implicitamente, como um chamado para que os cristãos respondam ao desafio do mundo muçulmano. Assim, o livro é dividido em duas partes principais: a primeira, intitulada “Minarete e muçulmanos”, na qual ele explica os princípios básicos da crença muçulmana, e a segunda, “Minarete e cristãos”, na qual ele apresenta os cinco aspectos de seu chamado — um chamado à compreensão, ao serviço, à reparação (a tentativa de reparar a situação na qual os muçulmanos são tão profundamente desconfiados dos cristãos), à interpretação e à paciência.

Ao ler o livro, duas ênfases em particular me causaram impacto. A primeira é a importância que o bispo Cragg dá ao que ele chama “a ambição pelo entendimento”[1]. Se quisermos ser entendidos, primeiramente devemos, nós mesmos, lutar para entender. E o tipo de entendimento que ele almeja não é meramente o conhecimento acadêmico que pode ser obtido ao estudar o islamismo, mas uma conscientização muito mais íntima, que surge do encontro pleno com muçulmanos. Chegaremos à compreensão por meio de pessoas, e não apenas de livros. O cristão “deve esforçar-se por entrar no viver diário dos muçulmanos, como cristãos, adeptos e homens”[2].

Para começar, o cristão deve entender o que o islamismo significa para o muçulmano. Devemos “procurar conhecer, tan­to quanto possível, o interior. Desejamos ouvir do minarete a saudação de cada manhã e o cumprimento de cada entardecer de milhões de homens contemporâneos, e assim entrar com eles pelo portal da mesquita até seu mundo de significados”[3]. Porém, em seguida, o cristão deve também entender o que o cristianismo é para o muçulmano. O cristão deve sentir vergonha das Cruzadas e da amarga polêmica medieval contra o islamismo, e deve procurar entender a repulsa que os muçulmanos sentem pelo imperialis­mo e pelo secularismo ocidental e sua incompreensão declarada do apoio injusto que o ocidente dá a Israel em detrimento aos árabes. O cristão também deve se esforçar por entender o que o bispo Cragg chama de “equívocos maciços” dos muçulmanos[4] sobre a teologia cristã — sobre as doutrinas cristãs de Deus e da Trindade, sobre Cristo e a cruz, e sobre salvação.

Contudo, o chamado do minarete ao cristão não é somente à compreensão. É também à ação, tanto no aspecto positivo quanto no negativo. O bispo Cragg utiliza a palavra reparo para indicar a obra de restituição que nós, cristãos, precisamos fazer. “Entre os fatores que contribuíram para o avanço do islamismo”, escreve ele, “está o fracasso cristão da Igreja. O fracasso no amor, na pureza e no fervor, o fracasso de espírito […]. O islamismo se desenvolveu em um ambiente de cristianismo imperfeito[5], até mesmo de um “cristianismo delinquente”[6]. Assim, o cristão

aspira desfazer a alienação e corrigir o passado por meio de uma restituição tão completa quanto consiga do Cristo que é estranho para o mundo muçulmano. O objetivo não é, como acreditavam os expedicionários, a recuperação do que a cristandade perdeu, mas a restituição, aos muçulmanos, do Cristo que eles perderam […]. Que fique claro que a restau­ração não é territorial […]. A restauração é espiritual. O alvo não é ter um mapa mais cristão, mas Cristo mais vastamente conhecido […]. A restauração não significa colocar catedrais no lugar das mesquitas, mas devolver o Cristo […]. Restituir Cristo transcende tudo mais[7].

O conceito de “restauração” do bispo Cragg já tem se tornado positivo. Esse conceito conduz naturalmente ao segundo chamado, que é à interpretação:

Se Cristo for o que Cristo é, ele deve ser propagado. Se o islamismo for o que o islamismo é, isso “deve” ser irresistível. Onde houver dúvida, o testemunho deve penetrar; onde estiver encoberta a beleza da cruz, ela deve ser desvendada: onde os homens tiverem perdido Deus em Cristo, ele deve ser devolvido a eles […]. Nós apresentamos Cristo pela única e suficiente razão pela qual ele merece ser apresentado[8].

Assim, o bispo Cragg se entrega ao trabalho da interpretação, e, fazendo isso, percorre cinco áreas teológicas centrais — as Escrituras, a pessoa de Jesus, a cruz, a doutrina de Deus e a igreja. Ele clama o tempo todo por paciência, por “paciência com os equívocos monumentais que devem, de alguma forma, ser removidos”[9], na verdade, por “aquela labuta em paciência que é a missão cristã[10].

De modo semelhante, o bispo Stephen Neill escreve palavras tocantes no capítulo sobre o islamismo em seu livro Christian Faith and Other Faiths:

Os cristãos devem persistir no convite sincero ao diálogo verdadeiro; eles devem exercitar a paciência ilimitada e recusar se sentirem desanimados. E a essência de todo o seu convite deve ser “considere Jesus” […]. Não temos outra mensagem […]. Não é que os muçulmanos viram Jesus de Nazaré e o rejeitaram; eles nunca o viram, e o véu da distorção e do preconceito ainda está sobre suas faces[11].

Trecho do livro As controvérsias de Jesus, de John Stott, p. 93.

Notas:
[1] The Call of the Minaret, Lutterworth, 1956, p. viii.
[2] Idem, p. 189.
[3] Idem, p. 34.
[4] Idem, p. 319.
[5] Idem, p. 245.
[6] Idem, p. 262.
[7] Idem, p. 245-246, 256-257.
[8] Idem, p. 334-335.
[9] Idem, p. 334-335.
[10] Idem, p. 347.
[11] Christian Faith and Other Faiths. Oxford University Press, 1961, p. 65-66, 69.

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