O som do facão cortando o mato me faz parar de fazer o que me prendia a atenção. A memória atravessou o tempo mais rapidamente que qualquer coisa. De repente, veio à mente a imagem dos braços fortes de meu pai limpando o quintal de casa. Ele, que sempre passou a imagem de firmeza moral, enfrentava folhas e galhos com vontade, como se fosse um tipo de desabafo diante da frustração de um mundo inadequado.

O barulho de hoje de manhã veio do vizinho, um senhor de mais de 70 anos. Na conversa que tivemos logo em seguida, conheci um pouco da sua história. Filho temporão, de jovem mãe negra e pai branco já idoso. Meu vizinho cortava o mato como se fosse uma missão. A missão de evitar esconderijos para insetos perigosos. Zelo de proteção.

Minha memória entende a lição. A firmeza da vida é, por vezes, um peso grande demais quando precisamos manejar com cuidado o que amamos. Carecemos de sabedoria para usá-la. Mas inevitavelmente o mato cresce, e nos cabe usar da firmeza para limpar o que a imperfeição sujou. Mesmo que o som seja bruto.

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