Uma confusão com estas duas palavras – simples e simplista – quando buscamos compreender o Evangelho de Jesus pode causar consequencias trágicas. É como olhar para o céu e ver a clareza, a harmonia e a simplicidade da paisagem. No entanto, esta experiência não torna o céu algo simplista. É preciso uma bom tempo de dedicação para estudar os fenômenos que geram a realidade das nuvens, das cores, da aparência. (Sem falar obviamente que nem sempre o céu tem a mesma aparência)

Falar do Evangelho de Jesus é dizer que o que ele nos oferece está acessível a qualquer pessoa, e que a graça de Deus possibilita o deleite e o envolvimento do ser humano na realidade das virtudes do reino de Deus. Mas isso não quer dizer que para alcançar o homem e a mulher devemos simplificar o Evangelho. Ele não é um mero joguinho de criança, muito menos uma interpretação fácil, rápida e subjetiva de textos bíblicos. Por que não?

  • Porque o Evangelho é divino, e não temos controle sobre ele. Quem nos revelou a mensagem foi o próprio Deus. E nos últimos dias, ele nos falou por meio de Jesus Cristo (Hb 1.2), a revelação exata de Deus Pai (Hb 1.3). Ele é o autor da mensagem, nós somos mensageiros.
  • Porque o Evangelho toca as feridas mais profundas, e isso é inegociável. Se a mensagem cristã não toca a profundidade da constituição humana, não é cristã (isso dói e pode gerar rejeição). Como diz o apóstolo Paulo, o Evangelho é o poder de Deus para a salvação de todo aquele que crê (Rm 1.16).
  • Porque estamos em uma guerra, e o Evangelho é um instrumento para acabar com ela. Não dá para compreender o Evangelho, como se estivéssemos sentados no sofá da sala, vendo TV. Se não nos envolvemos na luta contra o mal, contra o pecado, contra a injustiça, a mensagem do Evangelho será resumida a um conteúdo de auto-ajuda religiosa, que traz consolo e alívio para quem está cansado de viver. Segundo Paulo, precisamos de uma armadura, e o Evangelho são os nossos calçados para vencer a guerra e reestabelecer a paz (Ef 6.15). Quem esteve/está em contextos de guerra sabe como é difícil viver assim. Tornar o evangelho simplista em situações como essa é tratar um doente apenas com analgésicos, sem curá-lo, de fato.
  • Porque o Evangelho nos coloca em uma longa caminhada, e isso exige perseverança. O Evangelho não é comida fast-food. Ele não é importante apenas para suprir nossas necessidades básicas imediatas. Ele nos coloca em uma caminhada longa e fascinante. Já não somos mais os mesmos e não o seremos mais ainda a cada passo que dermos. Muitos têm usado a bandeira dos milagres ou a bandeira da religiosidade legalista e supersticiosa para apressar e facilitar a digestão do Evangelho. No entanto, isso não adianta muito, porque a caminhada vai continuar, e os que não compreendem a real profundidade do que estão consumindo, não terão força e vontade para seguir em frente (Mt 13.20.21).

Certamente há outros motivos para considerar que o Evangelho não é simplista. Quem tiver interesse em acrescentá-los nos comentários deste artigo, fique à vontade. O importante é saber que o Evangelho é claro e acessível, mas não a custa das tentativas de esvaziá-lo. Se assim for, estaremos igualmente perdidos como antes.

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