Deus, o Senhor da história

Deus, o Senhor da história 

Texto base: Josué 5.1-15

Leitura diária
D – Gn 1.1 – 2.3 – Deus, o Criador de tudo;
S – Sl 97.1-12 – O domínio de Deus sobre tudo;
T – Sl 139.1-24 – A presença de Deus revela seu plano;
Q – Pv 8.1-36 – A sabedoria dá vida;
Q – Rm 11.33-36 – A sabedoria nos desígnios de Deus;
S – Ez 37.1-14 – O poder vivificador de Deus;
S – Jo 1.1-14 – O plano de Deus em Cristo

INTRODUÇÃO

Uma das teses mais pertinentes sustentadas pelos reformados é que Deus é o Senhor da história. Pensar dessa forma significa atribuir a Deus o senhorio absoluto de todas as áreas do universo, amplamente compreendidas. Esta visão é muito bem expressa na frase de Abraham Kuyper: “Não há um centímetro no universo sobre o qual Cristo não diga: é meu”.

Deus não somente criou o universo, mas ele interfere diretamente nele, modificando constantemente a nossa visão das coisas para compreendermos os planos e as ações de Deus ao longo da História.

O livro de Josué deixa clara esta verdade. As estratégias militares e as conquistas de guerra não servem para mostrar o poderio dos exércitos, mas para apresentar um Deus que é capaz de cumprir seus objetivos em qualquer circunstância.

Quais as formas de Deus agir como Senhor da história? Em que medida ele interfere nas relações humanas? Vejamos no capítulo 5 de Josué alguns elementos que caracterizam o modo de Deus agir. 

I. RENOVANDO CONTINUAMENTE A ALIANÇA

Ainda que o povo quebrasse sempre o pacto que o Senhor havia feito com eles, Deus mesmo providenciava a renovação. A renovação da aliança era necessária, porque significava que Deus não havia se esquecido do seu povo e que ele travaria as batalhas com ele. Deus é fiel às suas promessas independentemente de nossa atitude e reação para com ele: “se somos infiéis, ele permanece fiel, pois de maneira nenhuma pode negar-se a si mesmo” (2Tm 2.13). Vejamos abaixo os sacramentos veterotestamentários que serviram de símbolo da fidelidade contínua de Deus: 

A. Circuncisão = batismo

Uma das formas de renovar esta aliança era a circuncisão. A circuncisão era um rito necessário para que o povo pudesse participar dos privilégios e das promessas da Aliança feita com Abraão e seus descendentes (Gn 17.14; Êx 4.24). Pelo texto em questão, parece que a prática tinha sido abandonada por um tempo, mas era altamente necessária, especialmente em momentos que Israel entraria em guerra. A circuncisão era um ritual de santificação.

A circuncisão significava o abandono do pecado e deixar para trás o passado, que incluía a escravatura e a opressão por parte dos povos estrangeiros. O Egito tinha significado forte opressão e um modo duro de os israelitas conviverem com o próprio pecado da desobediência.

Portanto, a circuncisão era a restauração do pacto. Tratava da anulação daquele passado cruel e uma expectativa de uma nova esperança, absolutamente amparada na graça renovadora do Senhor, Deus da Aliança. A circuncisão era o ritual de identificação daqueles que são membros da aliança. Por isso todo israelita deveria ser circuncidado ao oitavo dia:

“Esta é a minha aliança, que guardareis entre mim e vós e a tua descendência: todo macho entre vós será circuncidado. Circuncidareis a carne do vosso prepúcio; será isso por sinal de aliança entre mim e vós” (Gn 17.10,11). Até mesmo os escravos do povo deveriam ter esta marca (Gn 17.13).

A circuncisão tornou-se obsoleta com a vinda de Cristo porque a marca da aliança não seria mais para uma única nação, mas para todos os que recebessem a Jesus, de todas as tribos, línguas e raças. Paulo deixou claro que a circuncisão não tem mais qualquer vantagem em Cristo e aquele que se obriga aos rituais judaicos e à circuncisão, está abandonando a graça e buscando justificação por conta próprio, ou por mérito próprio: “De novo, testifico a todo homem que se deixa circuncidar que está obrigado a guardar toda a lei. De Cristo vos desligastes, vós que procurais justificar-vos na lei; da graça decaístes” (Gl 5.3,4). Cristo não se importa com essa prática, e esta não favorece aqueles que a praticam: “Porque, em Cristo Jesus, nem a circuncisão, nem a incircuncisão têm valor algum, mas a fé que atua pelo amor” (Gl 5.6).

O novo regime que deve ser observado é o batismo, que representa a morte do velho homem, crucificado com Jesus na cruz, e o nascimento do novo homem, ressuscitado também com Jesus: “porque todos quantos fostes batizados em Cristo de Cristo vos revestistes” (Gl 3.27; Rm 6.4). 

B. Páscoa = santa ceia

Outra maneira de renovação do pacto foi a celebração da Páscoa. Em Josué 5.10, lemos que celebraram a Páscoa. Eles rememoravam a libertação do Egito como uma marca absoluta e definitiva da expressão divina de amor e misericórdia pelo povo escolhido. A páscoa fora instituída em Êxodo 12, antes de Deus enviar a décima e a mais terrível praga contra os egípcios. O sangue do cordeiro seria símbolo de propiciação, que significa “acobertar, cobrir”: “O sangue vos será por sinal nas casas em que estiverdes; quando eu vir o sangue, passarei por vós, e não haverá entre vós praga destruidora, quando eu ferir a terra do Egito” (Êx 12.13). O sangue do animal cobriria o povo de Israel, protegendo-o da morte.

A páscoa permanece sendo comemorada pela igreja neotestamentária até os dias de hoje e o será até o retorno de Jesus, como ele mesmo o determinou, ao instituir a santa ceia, antes de sua morte (Mt 26.26-29; Mc 14.22-26; Lc 22.14-20; 1Co 11.23-26). Enquanto o pão simboliza o seu corpo (Jo 6.35,48,51), o vinho simboliza o seu sangue: “A seguir, tomou um cálice e, tendo dado graças, o deu aos discípulos, dizendo: Bebei dele todos; porque isto é o meu sangue, o sangue da nova aliança, derramado em favor de muitos, para remissão de pecados” (Mt 26.27,28). Essa comemoração não é mais realizada apenas uma vez por ano, mas a igreja comemora o sacrifício de Jesus todos os dias, de maneira singular na santa ceia, com a igreja reunida. 

II. SUSTENTANDO O SEU POVO NA PERSEVERANÇA

Em 5.11, vemos que Deus fez com que o povo comesse do fruto da terra, do maná, e, finalmente, das “novidades de Canaã”. Esta passagem demonstra que Deus mostrou ao povo seu cuidado protetor, alimentando-o. Deus não havia abandonado Israel, embora o próprio povo o tivesse abandonado diversas vezes nas apostasias.

Mas, agora, eles deveriam comemorar, pois Deus lhes havia concedido vitórias, conquistando a terra prometida. Não se tratava mais de promessa. Eles estavam lá e podiam experimentar das novidades dos frutos. Isto foi para eles sinal da perseverança de Deus para mantê-los protegidos das nações estrangeiras. O alimento físico era uma prova concreta daquilo que Deus já havia feito por eles, milagrosamente com o maná, e agora, novamente com o maná, como se lhes dissesse: eu fiz uma vez e posso fazer sempre que quiser.

Uma menção interessante é que eles comeram antes mesmo de terem trabalhado. Esta é uma referência importante ao Éden, quando Deus deu de todo fruto para o homem, mas ele escolheu, pecaminosamente, aquele que não podia comer. Agora, Deus novamente mostra que é possível comer do fruto abençoado sem trabalhar. É uma maneira sutil de Deus lhes dizer: vocês poderiam ter tudo isso facilmente se não tivessem pecado. O pecado modifica as coisas e causa adversidades profundas em nossa relação pactual.

Esta é a Providência de Deus sempre manifestada ao seu povo. Ele nunca deixou de nutri-lo com suas bênçãos tanto espirituais quanto materiais. É assim que o salmista reconhece ao entoar o salmo 65, provavelmente composto para a celebração da Festa das Colheitas: “Tu visitas a terra e a regas; tu a enriqueces copiosamente; os ribeiros de Deus são abundantes de água; preparas o cereal, porque para isso a dispões, regando-lhe os sulcos, aplanando-lhe as leivas. Tu a amoleces com chuviscos e lhe abençoas a produção” (Sl 65.9,10).

Essa providência é evidente na própria criação, que também sabe reconhecer o seu Criador: “Tu fazes rebentar fontes no vale, cujas águas correm entre os montes; dão de beber a todos os animais do campo; os jumentos selvagens matam a sua sede… Fazes crescer a relva para os animais e as plantas, para o serviço do homem, de sorte que da terra tire o seu pão, o vinho, que alegra o coração do homem, o azeite, que lhe dá brilho ao rosto, e o alimento, que lhe sustém as forças… Os leõezinhos rugem pela presa e buscam de Deus o sustento… Todos esperam de ti que lhes dês de comer a seu tempo” (Sl 104.10,11,14,15,21,27). O que deve ser destacado é que os salmos atribuem tão somente a Deus a produtividade de toda a criação e o sustento dos homens e dos animais.

Mas o fato é que Deus fez o povo perseverar, dando-lhe alimento sólido para que eles estivessem seguros e motivados a buscar o alimento espiritual. 

III. ESCOLHENDO UM LÍDER PARA LHES GUIAR NO CAMINHO

Josué foi aquele a quem Deus escolheu para guiar o povo no caminho. A narrativa do capítulo 5.13-15 lembra o episódio de Moisés na sarça ardente, quando Deus também lhe apareceu comissionando-o para a grandiosa obra de restauração do povo de Israel. Essas aparições de Deus não eram tão incomuns para os patriarcas. O Senhor apareceu a Abraão e ele teve atitudes muito semelhantes à de Josué: “Apareceu o Senhor a Abraão nos carvalhais de Manre, quando ele estava assentado à entrada da tenda, no maior calor do dia. Levantou ele os olhos, olhou, e eis três homens de pé em frente dele. Vendo-os, correu da porta da tenda ao seu encontro, prostrou-se em terra” (Gn 18.1,2).

A reverência e o conhecimento sobre a pessoa que estava diante de Abraão o fizeram se prostrar em sinal de adoração e culto. O patriarca não deixou que o Senhor partisse até que lhe oferecesse uma hospedagem digna (Gn 18.3-8). Jacó, quando soube que Deus se fazia presente ao seu lado, também temeu (Gn 28.16,17).

Tal como aconteceu aos patriarcas da antiguidade, Josué também foi contemplado por uma dessas visitas especiais de Deus. Ele demonstrou algumas atitudes próprias do verdadeiro servo de Deus: 

A. Inquiriu para saber de quem se tratava (v.13c).

Esta é uma atitude nobre por parte dos que recebem a revelação divina. Ele não aceitou passivamente a presença do homem, porque ele não sabia, de fato, quem era. A pergunta foi reveladora, porque Josué quis, de fato, saber se ele era “por nós ou contra nós” (v.13c; Rm 8.31). A identidade estava revelada no apego ou não ao Senhor dos Exércitos. Ao que parece, Josué não teve grande surpresa em ver este homem com uma espada nas mãos. Este homem não estava em forma de gloriosa aparência que denotasse algo especial, de modo que Josué, num primeiro contato, o reputou como alguém semelhante a ele mesmo. Somente depois que aquele homem se apresentou que Josué se deu conta de quem ele era. 

B. Prostrou-se a adorou ao saber quem era (v.14b).

Josué, ao ouvir o homem dizer que ele era “príncipe do Senhor dos Exércitos”, prostrou-se, imediatamente, em terra, e o adorou. Esta é a principal atitude do verdadeiro servo: adorar a Deus. Josué percebeu que era servo e que o seu Senhor lhe falava. Neste instante, ele percebeu que suas forças não eram suficientes para levar o povo adiante; mas, ao contrário, reconheceu sua servidão e a ordenança de alguém muito superior a ele.

Quais as implicações dessa postura?

  • Deus é quem batalha em prol da igreja e é ele quem garante a vitória, como fez com Josué (Hb 2.9,10);
  • Nosso alistamento na batalha contra as forças do mal vem do chamamento do Senhor e não de nossa própria escolha (Rm 10.9);
  • Deus nos dá santidade para enfrentar principados e potestades e todos os dominadores deste mundo: “Descalça as sandálias de teus pés, porque o lugar em que estás é santo” (v.15b; Hb 2.11).

E a verdadeira atitude de Josué?

O texto é meio enigmático na resposta porque não entra em detalhes, apenas aponta para a obediência do servo de Deus: “E fez Josué assim” (v.15c). Esta atitude é semelhante ao chamado de Mateus, por exemplo, no Novo Testamento: “Partindo Jesus dali, viu um homem chamado Mateus, sentado na coletoria e disse-lhe: Segue-me! Ele se levantou e o seguiu” (Mt 9.9).

Os verdadeiros servos de Deus atendem prontamente o chamado, dispondo os seus corações à obra. Outro exemplo foi Isaías, quando no momento de sua disposição de servir a Yahweh: “Depois disto, ouvi a voz do Senhor, que dizia: A quem enviarei, e quem há de ir por nós? Disse eu: eis-me aqui, envia-me a mim” (Is 6.8).

Portanto, a reação de Josué foi correta, submissa e humilde. Ele era um grande líder, um general e o representante de Deus diante de Israel, no entanto, soube qual era o seu lugar diante do príncipe do Senhor. Naquele instante ele não era mais o líder, mas um simples servo e súdito do Rei, que é o Senhor Deus.

Josué ensinou com sua atitude como devemos nos portar perante o Senhor. Assim também Davi se colocou diante de Deus, mesmo sendo o rei de Israel, questionou: “Quem sou eu, Senhor Deus, e qual é a minha casa, para que me tenhas trazido até aqui?” (2Sm 7.18b). Ele amplia essa mesma questão e a aplica para todo homem: “que é o homem, que dele te lembres? E o filho do homem, que o visites?” (Sl 8.4). Não foi desse modo, porém, que Herodes agiu, mas aceitou a glória do homem e por isso foi punido por Deus no mesmo instante (At 12.21-23). 

CONCLUSÃO

Como o Senhor da história, Deus deve ser glorificado e honrado em todas as suas obras. Ele mostrou, por meio de Josué, que sua Providência não falha e que suas obras sempre visam o bem estar do seu povo. Ele alimenta e cuida da sua nação eleita, além de orientá-la diretamente pela sua Palavra e pelo seu Espírito, mas também por intermédio de homens escolhidos por ele mesmo, que são hoje os pastores e mestres que quando transmitem fielmente a Palavra de Deus, colaboram para que a igreja permaneça alimentada e protegida contra as forças de Satanás.

A fidelidade de Deus se comprova na igreja por meio de dois símbolos que permanecerão até o retorno de Cristo, o batismo e a santa ceia. Com eles a igreja é encorajada a manter a sua fé presa em Jesus e a batalhar por uma vida de santidade, lutando contra o pecado e contra todo pensamento que se levante contra Cristo, pois a igreja é tanto o baluarte como a coluna da verdade: “para que, se eu tardar, fiques ciente de como se deve proceder na casa de Deus, que é a igreja do Deus vivo, coluna e baluarte da verdade” (1Tm 3.15).

O Senhor que dirige a História providencia que o seu povo marche sempre em frente, sem temer o obstáculo (Êx 14.15), porque ele mesmo garante a vitória. Deus não promete que não haverá obstáculos, mas promete a sua presença para superá-los e vencê-los. Somente assim a igreja pode ter a esperança de ser vitoriosa.

Deus mantém o seu povo seguro, dando-lhe todas as bênçãos necessárias para sua manutenção, providenciando um líder que vá adiante deles no caminho. Não há razão para temer. “Se Deus é por nós, quem será contra nós?” (Rm 8.31). 

APLICAÇÃO

Você consegue perceber a interferência de Deus na sua vida? Você percebe o modo como Deus te alimenta diariamente tanto física como espiritualmente? Você glorifica a Deus pelos líderes que ele coloca à sua frente para lhe guiar o caminho?

Reflita sobre a importância de viver ao lado de Cristo e conhecedor de que nele temos a garantia da vitória.

 

>> Estudo retirado da revista Expressão – Finalmente Canaã, da Editora Cultura Cristã. Autoria: Wendell Lessa

 

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4 Comentários para “Deus, o Senhor da história”

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