A igreja e o verdadeiro Israel

A igreja e o verdadeiro Israel

Texto básico: Filipenses 3.2-11

Leitura diária

D – Ef 2.11-22 Aproximados por Cristo
S – Mt 23.1-39 Escribas e fariseus, hipócritas
T – At 13.16-52 Judeus contra o evangelho
Q – Rm 2.1-29 Exigido de judeus e gentios
Q – Rm 4.1-25 Bases da aliança com Abraão
S – Is 65.1-16 Deus e os seus servos
S – Is 49.1-26 Salvador de judeus e gentios

Introdução

Quando reconhecemos Jesus como o verdadeiro Israel, somos levados a per­guntar: quem é, então, o povo de Deus? Israel foi rejeitado? Que lugar os judeus ocupam nessa era em que Jesus edifica a sua igreja e a estende até os confins da terra?

A igreja se compõe de todos os que creem em Cristo e são salvos por ele, sejam judeus ou gentios.

I. Jesus, o salvador de seu povo

A pergunta sobre quem é o povo de Deus não é sem importância porque Jesus veio para salvar o seu povo dos pecados deles (Mt 1.21). Ele afirmou que seu povo era constituído daqueles que o Pai lhe dera e sua missão era não perder nenhum deles (Jo 6.37-39). Mais adiante, referindo-se aos discípulos, afirmou ter cumprido essa missão e intercedeu para que eles e todos os que viessem a crer fossem guardados pelo Pai (Jo 17.6,9,12,15,20). Assim, tão importante quanto a discussão sobre o verdadeiro Israel é a discussão sobre quem é o povo de Jesus.

Nas profecias de Isaías, o Servo do Senhor é apresentado no contexto da re­denção de Jerusalém e de Judá (Is 44.26). Pouco adiante, ele registra que sua missão era restaurar as tribos de Jacó e trazer os remanescentes de Israel. Nesse mesmo texto, é afirmado que, além disso, o Servo do Senhor deveria ser luz para os gentios e a salvação do Senhor até as extremidades da terra (Is 49.5-6). Dessa forma, fica claro que o povo de Jesus compõe-se de judeus e gentios. Isaías 53 registra que, com seu conhecimento, o Servo do Senhor justificaria a muitos e levaria as iniquidades deles. Esses seriam dados pelo próprio Deus. É em favor desse povo que o Servo se entrega e ficará satisfeito quando vir o fruto do seu trabalho (Is 53.11-12). Podemos dizer então que o povo do Messias é aquele que efetivamente ele salva. Independentemente de origem ou qualificação pessoal.

Paulo destacou essa verdade. Aos ro­manos, escreveu: “não me envergonho do evangelho, porque é o poder de Deus para a salvação de todo aquele que crê, primeiro do judeu e também do grego” (Rm 1.16). Aos efésios, lembrou que o sangue de Cristo derrubou a inimizade entre judeus e gentios, reconciliando ambos em um só corpo, tornando-os concidadãos santos e membros da fa­mília de Deus (Ef 2.13-19). Assim, não há qualquer restrição étnica, social ou pessoal para ser parte do corpo de Cristo (Gl 3.28; Cl 3.11). A implicação disso é que devemos nos acolher uns aos outros e juntos louvar e glorificar a Deus, da mesma forma que Cristo acolhe judeus e gentios confirmando as promessas aos patriarcas e estendendo sua misericórdia aos gentios (Rm 15.5-12).

II. Jesus em busca de Israel

Jesus claramente confirmou sua missão entre os judeus. Ao orientar o trabalho dos doze discípulos, Jesus disse que gentios e samaritanos deveriam ser evitados e as ovelhas perdidas da casa de Israel deveriam ser procuradas (Mt 10.5-6). Foi somente após sua ressurreição que Cristo comissionou os discípulos a levarem o evangelho a todas as nações (Mt 28.19; At 1.8). Seguido por uma mulher cananeia, ele afirmou ter sido enviado às ovelhas perdidas da casa de Israel (Mt 15.24). Suas ações em favor de gentios eram exceções que ressaltavam uma manifestação especial de fé (Mt 8.10-11). O foco de Jesus nos judeus pode ser visto em Lucas 19.9 que, ao registrar a conversão de Zaqueu contra a opinião de todos, ressalta que ele também era filho de Abraão. Tanto Marcos quanto Lucas registram que Jesus pregava o evangelho nas sinagogas (Mc 1.39; Lc 4.44). Na discussão com a mulher samaritana, Jesus afirmou que a salvação vem dos judeus (Jo 4.22).

Jesus, em seu ministério, deu mais atenção aos judeus, visto que conduzir os filhos de Abraão de volta à obediência a Deus era a missão do Filho de Davi.

A primazia dos judeus no evangelho é fartamente registrada no Novo Testamento. Em seu sermão no templo, Pedro afirma: “Tendo Deus ressuscitado o seu Servo, enviou-o primeiramente a vós ou­tros para vos abençoar, no sentido de que cada um se aparte das suas perversidades” (At 3.26). Provavelmente, foi por isso que os judeus dispersos na perseguição após a morte de Estevão pregavam o evangelho apenas a outros judeus (At 11.19). Até mesmo Paulo e Barnabé, os mais destacados ministros do evangelho aos gentios, reconheciam essa preferência: “Cumpria que a vós outros [judeus], em primeiro lugar, fosse pregada a palavra de Deus; mas, posto que a rejeitais e a vós mesmos vos julgais indignos da vida eterna, eis aí que nos volvemos para os gentios” (At 13.46). Assim, sempre começavam o seu trabalho pela sinagoga local. Não é casual a expressão de Paulo: “primeiro do judeu e também do grego”.

III. Jesus e a rejeição de Israel

Entretanto, é preciso lembrar um impor­tante aspecto da relação entre Jesus e os judeus. João o descreve assim: “Veio para o que era seu, e os seus não o receberam” (Jo 1.11). Será que Jesus e seus discípulos falharam nesse que seria o principal ponto de sua missão?

a. Judeus que creram em Jesus

Multidões seguiam a Jesus (Mt 4.25); muitos buscavam não somente ser curados, mas também ouvir os seus ensinamentos (Mc 10.1; 12.37; Lc 5.15). Mateus registra que as multidões ficavam maravilhadas com o ensino dele, revestido de autoridade, diferente dos escribas (Mt 7.28-29; 22.33). Em Jerusalém, Jesus foi recebido por uma multidão que o saudava como filho de Davi (Mt 21.8-11). A aceitação de Jesus era tal que, certa vez, os fariseus se viram de mãos atadas (Jo 12.19). Temiam a reação do povo, por isso prenderam Jesus de noite e o julgaram rapidamente. Lucas registra que enquanto Jesus se dirigia para a cruz, numerosa multidão o seguia e mulheres de Jerusalém se lamentavam e choravam (Lc 23.27).

Nada sabemos sobre a condição espiritual dessas pessoas, se depois uniram-se à igreja ou não, mas o fato é que a comunidade inicial em Jerusalém no dia de Pentecostes era composta de cento e vinte judeus e que, após o derramamento do Espírito, judeus de todas as partes do mundo ouviram a pregação do evangelho e três mil deles foram con­vertidos e batizados. Lucas registra que, em Jerusalém, os que creram eram uma multidão (At 4.32). Em certo momento, chegaram a cinco mil crentes (At 4.4). Assim, podemos dizer que Israel estava muito bem representado na composição inicial da igreja. Especialmente quando consideramos que todos os apóstolos eram judeus.

b. Judeus que rejeitaram Jesus

No entanto, também é verdade que muitos seguiam a Jesus por interesses reprováveis, como registra claramente João 2.23-24: “… muitos, vendo os sinais que ele fazia, creram no seu nome; mas o próprio Jesus não se confiava a eles, porque os conhecia a todos”. João 6.26-27 apresenta o desafio de Jesus: “… vós me procurais, não porque vistes sinais, mas porque comestes dos pães e vos fartastes”. Quando confrontados com a responsabi­lidade exigida pelo evangelho, muitos o abandonaram (Jo 6.66).

Os evangelhos também registram uma forte oposição da liderança dos judeus a Jesus. Tomados por inveja, criticavam suas ações, especialmente seu contato com gente marginalizada e as curas realizadas aos sábados (Lc 5.30; 6.7). Tentaram muitas vezes pegá-lo em contradição para acusá-lo (Lc 11.53). Por fim, resolveram prendê-lo e matá-lo antes que conquistas­se definitivamente a multidão (Mt 26.3-4).

Jesus criticou esses líderes, denuncian­do sua hipocrisia, sua incapacidade de conduzir o povo na obediência a Deus e sua rejeição dos profetas do Senhor (Mt 23). São eles o alvo de parábolas como a do filho perdido (Lc 15) e dos lavradores maus (Lc 20.9-19). Nessa última, Jesus anunciou que o dono da vinha exterminaria os lavradores e entregaria a vinha (Israel) a outros. Dessa forma, quando falamos da rejeição de Israel devemos indicar essa liderança rebelde que foi destituída devido à sua resistência a Jesus.

Paulo também registra que enfrentou muita resistência dos judeus em suas viagens missionárias, especialmente quando viam que o evangelho também estava sendo oferecido aos gentios (At 13.42-46). Em Romanos 9, Paulo fala de sua tristeza pela resistência dos judeus ao evangelho e discute as implicações teológicas dessa rejeição. Ali afirma que a promessa do Senhor foi dirigida não a todos do povo, mas a um remanescente de Israel (Rm 9.27-29). No capítulo 11, ele afirma que de modo nenhum Deus rejeitaria o seu povo, lembrando que ele mesmo era da linhagem de Israel (Rm 11.1). Observou que os dons e a vocação de Deus são irrevogáveis e que os judeus receberão misericórdia do mesmo modo que os gentios a receberam (Rm 11.29,31).

Assim, da mesma maneira, encontramos entre os judeus a resistência pecaminosa ao evangelho que vemos nos gentios. Do mesmo modo como a graça soberana transforma o coração de gentios, transforma o coração de judeus para que todo o Israel, composto de judeus e gentios, seja salvo (Rm 11.26).

Esse quadro confirma aquilo que profetizou Isaías. Enquanto o povo rebelde rejeitava a Palavra de Deus, o Senhor seria achado por aqueles que não o buscavam. Somente um remanescente de Israel seria salvo (Is 65.1-10; 6.13).

IV. A verdadeira circuncisão

Somos levados a concluir que o verdadeiro Israel não se constitui geneticamente, mas pela fé. João Batista afirmou que de pedras Deus poderia suscitar filhos de Abraão (Lc 3.8) e Paulo ensinou que “nem todos os de Israel são, de fato, israelitas; nem por serem descendentes de Abraão são todos seus filhos” (Rm 9.6-7). Com isso em mente, Paulo estabelece o tema da verdadeira circuncisão. Aqueles que, a despeito do ritual, tem de fato uma aliança com Deus.

A verdadeira circuncisão se manifesta pelo cumprimento da lei (Rm 2.25-29). Alguém que está em aliança com Deus observa os seus preceitos. No caso dos judeus, a circuncisão tem valor se a lei for praticada. Para os gentios, mesmo sendo incircuncisos, o cumprimento da lei é considerado como circuncisão. Paulo conclui que a circuncisão está no coração e seu louvor vem da parte de Deus. Por essa razão, os crentes não devem preo­cupar se são ou não circuncidados, pois “o que vale é guardar as ordenanças de Deus” (1Co 7.18-19).

Além disso, a verdadeira circuncisão é gerada pela fé (Rm 4.9-13). Paulo mostra que a aliança foi estabelecida com Abraão antes da instituição da circuncisão. Ele foi considerado justo quando creu na promessa de Deus (Gn 15.6) e não quan­do se circuncidou. A circuncisão foi um selo, uma confirmação da aliança. Assim, a descendência de Abraão se constitui daqueles que creem nas promessas da redenção. Judeus ou gentios são filhos de Abraão quando seguem os seus passos na fé. Paulo escreveu aos gálatas: “… Abraão, … creu em Deus, e isso lhe foi imputado para justiça. Sabei, pois, que os da fé é que são filhos de Abraão” (Gl 3.6-7). Disso decorre que a verdadeira justiça é aquela instituída por Deus e que provém da fé e atua pelo amor (Gl 5.5-6; Fp 3.9).

Por fim, Paulo registra que a verdadeira circuncisão é o ser nova criatura (Gl 6.15). A obediência e a fé, características da verdadeira circuncisão, não provêm da genética humana, nem do esforço dos homens. João escreve que os que receberam a Jesus, receberam o poder de serem feitos filhos de Deus e acrescenta: “os quais não nasceram do sangue, nem da vontade da carne, nem da vontade do homem, mas de Deus” (Jo 1.12-13). Desse modo, ser povo de Deus não se define pela genealogia, mas pelo nascer de novo. Para serem chamados de Israel de Deus, tanto judeus quanto gentios precisam desse novo nascimento que vem do alto. Por isso, Paulo afirma: “… nós é que somos a circuncisão, nós que adoramos a Deus no Espírito, e nos gloriamos em Cristo Jesus, e não confiamos na carne” (Fp 3.3). Após afirmar que a salvação vinha dos judeus, Jesus observou que uma grande mudança estava acontecendo. Havia chegado a hora em que o Pai seria adorado em espírito e em verdade. São esses os que o Pai busca para serem seus adoradores (Jo 4.23). 

Conclusão

O povo de Deus se constitui de todos aqueles que creem em Jesus, obedecem a Deus e o adoram em espírito e em verdade. Não importa se são gentios ou judeus. A obra salvadora de Deus atingiu e atinge a todos indiscriminadamente. Assim, Deus cumpre todas as suas promessas feitas ao povo de Israel e todas as promessas feitas aos gentios. Ainda que possa parecer que a palavra de Deus tenha falhado (Rm 9.6), a verdade é que judeus e gentios têm encontrado misericórdia e salvação em Jesus Cristo e a encontrarão até que todo o Israel seja salvo (Rm 11.26).

Aplicação

Que critério você usa para identificar-se como membro do povo de Deus? A crença de seus pais? A membresia de uma igreja? Embora tudo isso seja importante, consi­dere se você tem apresentado evidências de uma vida em aliança com Deus.

>> Autor do Estudo: Dario de Araújo Cardoso
>> Estudo publicado originalmente pela Editora Cultura Cristã, na série Palavra Viva. Usado com permissão.

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5 Comentários para “A igreja e o verdadeiro Israel”

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