Conteúdo oferecido como Mais na internet na edição #368 da revista Ultimato

Por Neiva Marize Cruvinel Garcia

Comer juntos como família parece ser comum na maioria das culturas e países. Lembro-me da primeira vez que deixei o Brasil a caminho dos Estados Unidos. Já no voo, tive um pouco de indisposição ao tipo de comida que serviram, por não me ser familiar. No segundo dia, senti saudade do nosso arroz com feijão. Minha primeira semana foi de total imersão no novo estilo de comida, pois meu trabalho era cozinhar para americanos idosos. Gostavam do que eu cozinhava, mas eu mesma não gostava dos pratos que preparava.

Sou grata, pois cozinhar para americanos foi uma fonte de sustento para os primeiros anos missionários fora do Brasil. Foi durante esse período que aprendi a cultura, a língua e os costumes norte-americanos, assim como várias outras culturas com as quais compartilhei a mesa. Nunca mais fui somente brasileira, pois havia me aculturado com o propósito de expandir o evangelho, servindo pessoas dentro dos seus costumes e sabores. Com alguns comi com as mãos, com talheres ou com pauzinhos. Comi usando casca de bananeira ou o mesmo prato do outro, sempre na cultura de cada mesa servida.

Em 1996 mudamos para o Canadá para o ensino de missões transculturais. Convidávamos alunos para irem à nossa casa e servíamos comidas étnicas em celebrações especiais. Nessa época também fiz estágio de um ano em uma igreja chinesa, onde aprendi receitas tradicionais. Voltamos para os Estados Unidos em 2000. Continuamos a ministrar a alunos internacionais universitários, principalmente asiáticos. A maioria deles nunca havia visto uma Bíblia nem havia entrado na casa de um cristão. Convidamo-nos para almoçarem em nossa casa aos sábados. Quando eu perguntava o que gostariam de comer, diziam que queriam arroz asiático com qualquer outra coisa. Como havia um grande número de alunos japoneses, fui intencionalmente aprendendo sobre os pratos japoneses. Também decidimos hospedar alunos asiáticos, que moravam de um a quatro anos nos Estados Unidos para estudar. Com o tempo, tivemos liberdade para conversar sobre Jesus, a Bíblia e a fé cristã. Ehud era pastor de missões em uma igreja local e, à medida que os alunos se convertiam, eram batizados e discipulados antes de regressarem ao seu país. Outros vinham à nossa casa somente pelo relacionamento e pela comida.

Um dos primeiros jantares especiais foi no Dia de Ação de Graças. Como muitos viajam nessa data, cozinhei pensando que viriam somente uns doze alunos. Para nossa surpresa, muitos foram chegando, até que contamos trinta adultos. À essa altura, Ehud me perguntou se ele deveria buscar pizza, pois a comida não seria suficiente. Sem hesitar, disse-lhe que não; devíamos orar e esperar que Jesus aumentasse a comida. Servimos trinta e cinco pessoas, e a comida não acabou. Parecia que aumentava à medida que chegava à mesa. Quando normalmente deveria diminuir, mais comida surgia nas travessas. Todos comeram à vontade e ainda levaram pratos cheios para as suas casas, como de costume.

Aos poucos, esses alunos foram fazendo perguntas específicas sobre a fé cristã. Alguns diziam que ficavam envergonhados, pois nunca poderiam se tornar cristãos, e nós éramos tão bondosos com eles. Diziam que vinham principalmente pela amizade e pela comida, pois sentiam muita falta de casa, mas não queriam nos enganar.

Introduzimos o evangelho por meio de conversas simples, mas diretas. Tínhamos Bíblias em vários idiomas, e os estudantes ficavam admirados ao vê-las na sua própria língua. Assim, muitos se converteram ao redor da mesa servida e abençoada. Esse ministério continua na casa de um jovem casal americano, a quem discipulamos e treinamos para servirem da mesma maneira.

Ehud e eu, por nossa vez, estamos em outra cidade, em outra igreja. Mas já estamos colhendo informações nas faculdades para iniciar contatos com alunos internacionais e seguir o exemplo de Jesus à mesa, onde ele disse: “Dai-lhes vós mesmos de comer!”.

• Neiva Marize Cruvinel Garcia, casada com Ehud Marques Garcia, estudou missiologia no Seminário Teológico Fuller, em Pasadena, Califórnia, e é mestre em missiologia pela Escola de Pós-Graduação Prairie, em Calgary, Alberta, Canadá. Foi deã da escola de missões do Centro Evangélico de Missões (CEM) entre 2013 e 2017 e atualmente é missionária com a Diaspora Intercultural Academy.

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